Veja bem, caro leitor, não sei há quanto tempo você está em casa, mas, tenha certeza de que essa será sua realidade, e por um longo tempo. Se ainda não entrou nesse regime de confinamento, não tenha dúvidas, logo vai entrar. Se mora no Estado de São Paulo, por exemplo, já existe até data para isso: terça-feira (24/03). Teremos que ficar em casa até o dia 07 de abril, no mínimo, em qualquer um dos 645 municípios paulistas. Segundo o Decreto[1] editado pelo Governador João Doria, isso implica na determinação, na obrigação, do fechamento de todo o comércio e serviços ‘não essenciais’ à população.

Na Banca Advocatícia onde trabalho, deliberamos instituir o home office na última quarta-feira. O que significa que estou em casa por 04 dias consecutivos. No meu caso, quebrando o confinamento somente por caminhadas na rua, guerra de aviões de papel e amarelinha na porta de casa, com minha esposa e minha filha. Sorte grande a minha!

Perceba, leitor, que serão outros 17 dias confinado, pois resido em Ribeirão Preto/SP. E você que mora em outras unidades da federação, não se sinta animado: quarentenas também virão no restante do país. E isso porque, no tocante à contaminação de COVID-19, segundo nosso Ministro da Saúde[2]: “a gente deve entrar em abril e iniciar a subida rápida, e isso vai durar os meses de abril, maio e junho, quando ela vai começar a ter uma tendência de desaceleração. No mês de julho deve começar o platô. Em agosto o platô vai começar a mostrar tendência de queda e aí a queda em setembro será profunda, tal qual a de março na China”. De se ver que tal quarentena será bem longa.

Ora, se vamos ter dois meses de aceleração dramática do contágio, significa que vamos ficar em casa por 60 dias, no mínimo. E é bem possível que esse período seja estendido, afinal, como frisou o referido Ministro na mesma entrevista: “claramente, no final de abril nosso sistema de saúde entra em colapso. (…) O que é um colapso? Você pode ter o dinheiro, o plano de saúde, mas, simplesmente não haverá sistema pra você entrar”.

É possível pensar um monte de coisas sobre a fala do Ministro. Eu penso que isso é de uma transparência incrível. Do tipo da que admiro muito, já que é uma espécie raríssima no meio político. Lembrando que Mandetta, além de médico, foi Deputado Federal. Algo semelhante fez a Chanceler Angela Merkel[3], ao anunciar aos seus cidadãos que “70% das pessoas na Alemanha serão infectadas”. A previsão, aliás, é que passada a atual onda de contágio, outras ondas virão nos anos subsequentes, de modo que a imunização da população ocorrerá em algum momento pelo próprio contato com a doença. Isso, é claro, se antes não for criada uma vacina eficaz. Mas as próximas ondas serão bem mais brandas, já que cerca de dois terços dos humanos já terão sido contaminados na atual pandemia. A não ser que haja uma mutação maligna… mas, não creio em algo do tipo.

Postas as coisas desta forma, é possível concluir que todos nós seremos contaminados em algum momento. Nossos esforços estão sendo feitos não para evitar o contágio, mas, para retardá-lo, postergando ao máximo eventual colapso no sistema de saúde pública.

De todo modo, muitos morrerão e essa é outra verdade. Porém, nada comparado a uma gripe espanhola, ocorrida cerca de 100 anos atrás. A média global está próxima a 4% dos infectados. Mas, como a subnotificação é grande – porque 80% dos que contraem a doença têm sintomas muito leves e sequer são testados –, se valer a estimativa do Presidente do Einstein de que para cada infectado há outros 15 ‘não diagnosticados’[4], então a taxa de mortalidade seria reduzida a algo como 0,2%. Muito menos alarmante.

Independentemente desses números, ilustre leitor, o fato é que estamos lidando com algo novo. E o novo, ainda mais em se tratando de uma peste, dá medo. E isso é normal!

Porém, tenho observado que a quarentena (mesmo que ainda estejamos bem no início de sua duração) está impactando emocionalmente as pessoas. E isso num nível que já desafiaria tratamento pela psicologia. Há ainda os casos evidentes para a psiquiatria. E, nesse campo, sim, a doença é democrática. Há pessoas de todo tipo com tais devaneios.

Não sou psicólogo ou psiquiatra, mas, me atrevo a dizer que quando o ser humano está com muito medo ele toma um de dois caminhos: paralisa ou ataca. Ora, como todos estão basicamente presos ao corpo físico e à sala de casa, os sentimentos, filhotes deste medo, mais fluídos e livres, encontram morada certa nos veículos da mídia e na internet.

Há torrentes de alarmistas: aqueles que paralisaram com medo e, para terem alguma segurança mental, precisam nos lembrar todo dia, a cada 15 minutos pra ser mais exato, os diversos cuidados que devemos tomar, como devemos lavar as mãos, usar álcool em gel, quais os telefones devemos anotar e, principalmente, quantos estão doentes, internados ou mortos – e isso em todos os países do mundo! É uma paranoia evidente.

Existem ainda aqueles que ficaram claramente agressivos, pois que igualmente foram tomados pelo medo. E como não podem sair de casa (por determinação) destilam essa raiva nas redes e na mídia. Assim é que assistimos a uma briga de foice no escuro entre esquerda e direita, principalmente no Twitter. O ser humano é excelente em julgar seu próximo. E, em momentos como esses, é certeza que o outro está mais errado que você.

Teremos um longo confinamento pela frente, acreditem! E tipos como os descritos acima vão se reproduzir juntamente com a praga corrente. Então, ilustre leitor, sugiro que você vá preparando uma bela higienização mental, obrigatória para todos os dias. Ou será arrastado por uma dessas hordas, numa espécie de ‘Walking Dead’ das ideias.

Veja bem, ninguém sairá “melhor” ou mesmo “pior” desta crise, do ponto de vista da constituição moral das pessoas. Isso é romantismo. Sucede que ficar confinado te torna mais próximo do seu eu real, pois há menos subterfúgios para as falhas morais. Aí entra em cena o fato de que todos se sentem mais “livres” para escrever o que vem na telha na internet. Daí que estão todos nus nas redes, para quem quiser ver. Observem a verdade ali. O subconsciente do indivíduo, tomado pelo medo, aflora nessa paralisia ou nesse ódio.

É preciso orar e vigiar! Ocupar a mente com coisas producentes e positivas. Nesses momentos há muita energia negativa pronta para arrebatar as pessoas incautas. E não vai acontecer a cura milagrosa amanhã cedo pessoal. Isso é embromação do WhatsApp. Estamos num processo de necessária depuração espiritual. A humanidade seguirá, com certeza. E uma parte vai perder a sanidade mental, infelizmente. Principalmente porque depois da passagem da peste, enfrentaremos todo tipo de dificuldade econômica, que será severa e vai assolar outro tanto de seres humanos, por um longo período à frente.

Assim, o mundo será dos mansos e pacíficos, acredite! Aqueles que sabem se servir da energia vital que vem de seus filhos, pais, esposos e amigos. Enfim, triunfará o amor

Referências:

[1] https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/2020/03/21/doria-decreta-quarentena-no-estado-de-sp-ate-o-dia-7-de-abril-para-impedir-avanco-do-coronavirus.ghtml

[2] https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,em-abril-o-sistema-de-saude-entrara-em-colapso-diz-mandetta,70003241718

[3] https://veja.abril.com.br/mundo/coronavirus-70-das-pessoas-na-alemanha-serao-infectadas-diz-merkel/

[4] https://saude.estadao.com.br/noticias/geral,presidente-do-hospital-albert-einstein-preve-pico-do-novo-coronavirus-em-duas-semanas,70003239115

FOTO: https://www.google.com/search?q=o+grito+edvard+munch&tbm=isch&chips=q:o+grito+edvard+munch,g_1:original&rlz=1C1GCEA_enBR815BR815&hl=pt-BR&ved=2ahUKEwjI89GCoq7oAhVCA7kGHfGUA6kQ4lYoAHoECAEQFA&biw=1349&bih=657#imgrc=-Y-o_LVLR7WijM

Ricardo Dantas

Ricardo Dantas

Advogado