Prezado leitor, gostaria de começar esta coluna agradecendo-o. Já se vão 5 meses desde que este Blog foi ao ar e, estando ainda você por aqui, é porque algo do que escrevo tem lhe agradado ou (mesmo desagradando) tem lhe interessado. Agradeço sua presença!

Pois bem, para ler minhas colunas, ou ler colunas de outros tantos que escrevem por aí, assim como para ler um livro, poesia, estudar publicações técnicas etc. é preciso algo que nem todos têm: o gosto pela leitura. Acredito que isso possa até ser inato do ser humano, mas, apostaria minhas fichas no sentido de que é algo que cada um desenvolve ao longo da vida. Quer dizer, a gente vai lendo, lendo e quando vê isso passar a fazer bem (e a fazer falta). Algo que era uma ‘obrigação’, passa a ser algo prazeroso (e instrutivo). Ora, se você está lendo minhas colunas, p.ex., é porque gosta de ler, não é mesmo? É fato.

Sucede que com a política acontece o mesmo. Dependemos muito dela, mas, nem sempre a acompanhamos com prazer, com entusiasmo. Acho que é algo tão importante quanto ler. E deveria ser exercitado na mesma medida, para a saúde do Estado e desenvolvimento das pessoas que nele vivem. Mas, aqui me refiro à atividade cívica da política, que está ao alcance de todos, mesmo que nunca se candidatem a qualquer cargo político.

“O homem é, naturalmente, um ser político” – como disse Aristóteles, mais de 300 anos a.C. Nos relacionamos em família, com os vizinhos,  amigos, colegas de escola, de clube, do trabalho etc. E nesses relacionamentos, muitas vezes, somos objeto de antagonismo de ideias por outras pessoas. Então, politicamente, adotamos resoluções que permitam que nossas opiniões e as do antagonista coexistam, sem que descambemos para uma contenda física. Isso porque, há milênios, aprendemos que é possível a convivência em grupo sem que, necessariamente, os mais fortes tenham que prevalecer sobre os mais fracos. Uma democracia, ademais, permite que grupos minoritários convivam no seio social sem que sejam objetos de perseguição ou outra forma de preconceito segregacional: é a liberdade!

Enfim, somos livres e políticos, portanto. A mim parece que essa é uma trilha pela qual a humanidade sempre vai caminhar. Ocorre que isso não dá o direito de as pessoas usarem essa liberdade para politizar (no sentido radical) todas as coisas. Não tem cabimento, para ficar apenas num exemplo banal, uma briga virtual sem precedentes no entorno da criação e circulação de uma nota de R$200,00 (duzentos reais). Pessoas que, como eu, viveram em períodos de megainflação, conheceram coisas inacreditáveis como uma nota de CR$500.000,00 (quinhentos mil cruzeiros) – a maior cédula que circulou no mercado brasileiro, emitida em 1993. Notas de dinheiro são postas em circulação para pagar bens e serviços. Uma nota de R$100,00 (cem reais), lançada em 1994, após a adoção do Plano Real, sofreu a corrosão inflacionária de 520% até hoje. Quer dizer, teríamos que ter uma nota de R$620,00 para pagar os mesmos bens e serviços que comprávamos com R$100,00 naquela época. Então, é algo natural termos uma nota de R$200,00 ou até maior que isso.

Ocorre que, algo simples assim, deixa de ser!! As pessoas se dividem em dois grupos, imediatamente. Quem é contra Bolsonaro odeia a nota de R$200,00 – que nem saiu da Casa da Moeda ainda. Dizem que ela vai patrocinar uma corrupção maior, vai facilitar as malas de propinas etc. E a turma que apoia o Bolsonaro já incluiu uma foto do próprio (fazendo ‘arminha’ com as mãos na cédula), circulando essa montagem só para fazer troça com os adversários políticos. Vejam aí a que ponto chegamos quando uma sociedade adoece. As pessoas estão se estapeando por qualquer coisa. Há inclusive familiares que deixaram de conversar, de se ver, em razão desse nível de bobagens. É estarrecedor!

Deveríamos pensar a política de um modo muito mais resolutivo que passional. Não deveria importar as intenções de uma política pública, mas, sim, quais são seus resultados. E a paternidade de algo que funciona nunca deveria ser atribuída apenas a um político, afinal, uma miríade de pessoas foi necessária para que aquela política funcionasse. Assim como algo que dá errado não deve ser atirado sobre os ombros de um ‘cristo’, afinal, se deu errado cabe a nós, enquanto sociedade, como seres livres e políticos, adotarmos novos e diferentes caminhos, de modo a consertar aquilo que não vinha funcionando.

Essas coisas me parecem evidentes, elementares. Mais: acompanhando e fazendo política há anos, não guardo rancores. Isso é algo mágico, acredite! Olho para Lula ou Bolsonaro, escuto seus discursos, vejo seus trejeitos populistas, e não tenho um sentimento diferente em relação a ambos. Nem amor, nem ódio, nem repulsa, nem nada… Apenas vejo, naquilo que dizem, coisas certas e coisas erradas. Ponto. Será que é tão difícil utilizar nossa racionalidade assim? Temos que resolver os problemas na base do ódio mútuo?

Enfim, o mundo está ficando um lugar muito chato. As pessoas parecem que fumam um tipo de ópio todo dia cedo. Então ficam vendo tudo escuro (se não gostam de alguém) ou tudo colorido (se simpatizam irracionalmente). Amigo, creia-me: Brasília continua na mesma, desde a sua fundação. Não vamos nunca melhorar nosso país se não tivermos representantes mais qualificados. E isso só acontecerá quando nós, os verdadeiros políticos (que elegem seus representantes – essa é a beleza da democracia, aliás!) nos dispusermos a verificar os ocupantes dos cargos por aquilo que fazem e não pelo que dizem. Isso é tão antigo que é um ensinamento bíblico, ainda não absorvido, infelizmente.

Quando nos postamos politicamente no centro (seja mais à esquerda ou mais à direita, mas, no campo não radical) somos imediatamente ‘cancelados’. Ah, dizem – esse aí é ‘isentão’! Ou algo como: é bolsominion, certeza! Ou então, é petista disfarçado. Não!!!

Vejam bem: há espaço para todos, inclusive para os radicais. Isso sempre existiu e sempre vai existir. Desde de que eles não peguem em armas e nos forcem a segui-los em suas convicções, isso representa apenas uma coisa: a democracia está funcionando! Agora, se todos nós nos pusermos a arrumar uma briga por cada fato banal, como a criação de uma nota de R$200,00 (duzentos reais), então, na verdade, estaremos esvaziando cada vez mais o campo do centro. Estaremos dando razão aos exaltados, brigando no campo deles. E isso só aprofunda a esterilidade do debate, facilitando o caminho para mais populismo.

O problema, portanto, não está nos ‘políticos’, mas, em nós – eu e você. Não temos os piores políticos do mundo. Temos os representantes eleitos pelos brasileiros. Então, se alguma crítica cabe aqui, ela é direcionada ao povo que habita nossa nação. Não é possível eleger aqui os políticos da Suécia, por exemplo. Temos que nos virar conosco mesmo. E se o eleito não está indo bem, não se frustre: nas próximas eleições você o apeia do cargo!

Vejo muitos debates na TV e em outros veículos da internet. Ali debatem tudo, menos algo óbvio: no Brasil, com 210 milhões de habitantes, o voto é dado de uma forma muito pragmática. O sujeito que não tem o que comer, por exemplo, vai votar naquele que acredita estar pagando a ele uma renda mensal. Não entende que quem está pagando essa conta é a sociedade, ou seja, todos nós. Que seria melhor que a economia estivesse funcionando bem, com oferta de emprego e dignidade. Mas, aqueles debatedores que são mais instruídos (porque tiveram alguma educação melhor) ao invés de procurarem esclarecer essa parcela da população, ficam discutindo bobagens e fomentando o ódio.

Nem resolvem o problema da pobreza, nem diminuem o voto de cabresto, nem melhoram a política. Política se faz com entendimento, com o consenso possível dentro do dissenso. Agir com o ‘coração’ ou com o ‘fígado’ não vai ajudar nada. Temos que utilizar o cérebro.

Referências:

FOTO: https://www.google.com/search?q=nota+de+200+reais&rlz=1C1GCEA_enBR815BR815&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=2ahUKEwiRgarH6vfqAhV8ILkGHX4QD9oQ_AUoAnoECAsQBA&biw=1366&bih=657#imgrc=5rP_4UKrcWErmM

Ricardo Dantas

Ricardo Dantas

Advogado