O mundo está se tornando um lugar surreal. Coisas que já aconteceram, já foram provadas, experimentadas e deram no que deram (errado, no caso), para horror da humanidade, teimam em voltar. Está sendo assim com temas como: a terra plana, a evolução das espécies, a cura de vírus mediante remédios milagrosos, a refutação de vacinas salvadoras, o reavivamento de ideias comunistas etc. É um fenômeno do ser humano, potencializado pela internet, é claro!

Algum sujeito mal-intencionado pega uma ideia estapafúrdia, coloca uma nova roupagem e, voilà, arruma uma porção de crentes para sua pregação enganosa. E faz isso pelos mais variados interesses, sejam econômicos, políticos, religiosos, dentre outros. Aquele que vende esse tipo de absurdo integra o núcleo do problema, mas, todos aqueles que dão guarida a essa sorte de coisas, as propalam, enfim, arrumam briga em casa, com vizinhos e colegas por simples idolatria (já que uma rápida pesquisa no Google desmascararia os “argumentos” fajutos dessas mirabolâncias refutadas ao longo da história), também fazem parte do problema, afinal, o tornam maior e perpétuo… Quer dizer, é como um trabalho de formiguinha, cujo objetivo é imortalizar idiotices – me desculpem, porém, não há outra definição melhor no Aurélio.

Obviamente há aquelas mentiras que são mais “rococós”. Quer dizer, é preciso analisar suas muitas nuances até desvendá-las. Quase ninguém está imune a cair num conto desse nível. Mas, quando o engodo é evidenciado por alguém, convém àquele que estava sendo passado para trás (re)analisar o caso e cair fora da boiada enquanto é tempo, caso contrário, estará se prestando de acólito voluntário do mau-caratismo alheio. Estamos nesse patamar (ou além) no Brasil.

Pois bem, recentemente ocorreu um episódio envolvendo o apresentador Monark e o deputado federal Kim Kataguiri, no qual defenderam em um podcast ao vivo que o país deveria permitir a existência de um partido nazista, sob o ponto de vista da “liberdade de expressão” (a exemplo do que ocorre nos Estados Unidos). Também se somou a isso, pouco depois, outro episódio em que o comentarista Adrilles Jorge, ao tratar do tema, fez um gesto entendido por alguns como uma saudação nazista, durante um programa da Jovem Pan.

Ora, como a Terra é redonda e o ser humano aprende com o passar dos anos, já estamos bastante escolados quanto ao que vem a ser o nazismo. Trata-se de um movimento político, liderado por Adolf Hitler, que se desenvolveu na Alemanha na década de 1920, e que foi caracterizado pelo racismo, o antissemitismo[1] e a eugenia. Resumidamente, uma dúzia de psicopatas, bastante inteligentes e bem articulados, perceberam que os alemães estavam no fundo do poço, após terem sido derrotados na 1ª Guerra Mundial. Daí, começaram a vender a ideia de que Deus criou os arianos para ser o topo da cadeia alimentar, a raça mais pura, enfim, os únicos seres humanos com algum direito (inclusive sobre outros seres humanos). Para tanto, eles tinham direito de escravizar e matar as sub-raças, anexar territórios para criar um “espaço vital” de produção e bem estar para si – o que desencadeou a 2ª Guerra Mundial. Mas, acima de tudo, decidiram criar a maior máquina estatal de extermínio já produzida pela humanidade, onde 6 milhões de judeus foram presos, confinados, torturados e abandonados passando frio e fome e, para aqueles que se recusavam a morrer de “causas naturais”, foram criados fornos e câmaras de gás, dentre outros, para que nenhum judeu sequer sobrasse dentro do “III Reich”. Se possível, para que nenhum judeu sobrasse na face da Terra. Olha que é um resuminho básico. Sugiro que pesquise – e vou deixar um link[2] com uma matéria que, sozinha, explica muita coisa a respeito.

Acontece que pessoas comuns acharam que seria bacana apoiar um negócio desses. Lógico que as coisas não se deram do dia para a noite, mas, dar suporte a um pacote de maldades só pode levar ao inferno, quando se rega todos os dias ideias como as nazistas. Foi assim que um pequeno grupo passou a ser movimento social abrangente, depois um um partido político e, por fim, um regime totalitário que mergulhou o mundo todo numa guerra, que durou de 1939 a 1945, onde 40 milhões de civis perderam a vida, bem como cerca de 20 milhões de soldados[3].

Desta forma, por mais “liberal” que se diga uma pessoa, e ainda que os Estados Unidos sejam um oásis permissivo para manifestações nazistas, o mundo todo (a parcela civilizada) condena com veemência qualquer apologia ao nazismo. Proíbem não só sua propagação por palavras e gestos como sua defesa. Muito menos toleram que se expresse na forma de um partido político. As coisas são assim porque o ser humano é fraco (e sabe disso)… Então, tratou de criar normas no ordenamento jurídico que impedem, para sempre, que aqueles ideais nefastos sejam resgatados como bandeiras na atualidade. O objetivo é impedir que mais 60 milhões (ou mais) morram num novo conflito armado, porque é isso que deriva de ideias e atitudes tão vis.

O Brasil possui regramento rígido a respeito do nazismo[4], desde a Constituição Federal de 1988 (que diz que “a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei” – art. 5º, XLII), passando pela Lei nº 7.716/1989, que define os delitos resultantes de preconceito de raça ou de cor, e que capitula como crime o seguinte:

Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Pena: reclusão de um a três anos e multa.

§1º Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo. Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.

§2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza: Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.

§3º No caso do parágrafo anterior, o juiz poderá determinar, ouvido o Ministério Público ou a pedido deste, ainda antes do inquérito policial, sob pena de desobediência: I – o recolhimento imediato ou a busca e apreensão dos exemplares do material respectivo; II – a cessação das respectivas transmissões radiofônicas, televisivas, eletrônicas ou da publicação por qualquer meio; III – a interdição das respectivas mensagens ou páginas de informação na rede mundial de computadores.

§4º Na hipótese do § 2º, constitui efeito da condenação, após o trânsito em julgado da decisão, a destruição do material apreendido.

Perceba, caro leitor, que a nossa norma é bastante rígida e visa suprimir o nazismo não só como ideal político, mas, inclusive os símbolos que a ele remetam – na verdade, essas condutas são consideradas criminosas. Então, obviamente, jamais seria possível a criação de um “partido nazista” em território nacional. Seria preciso escrever outra Constituição Federal do zero, pois o racismo é considerado crime por meio de uma cláusula pétrea. Percebam: é possível debater sobre o nazismo, investigá-lo, escrever sobre ele (como estou fazendo nesta coluna), mas, não é possível fazer apologia dele, defender seu ideário, e muito menos dizer que pode ser a base de um partido político no nosso país – não importa qual seja a intenção do interlocutor.

Defender, p.ex., a legalização das drogas ou do aborto (que são considerados crimes no nosso ordenamento jurídico também), ou a mudança de outras normas do gênero, em nada guardam relação com o que se pretendeu proibir com a vedação ao nazismo. Há escalas de grandeza entre tais coisas. E, se você não é nazista (ou simpatizante), há de entender o que quero dizer…

É por esse motivo que Monark acabou desligado do programa do qual era apresentador e sócio, Kataguiri enfrenta um processo na Comissão de Ética da Câmara dos Deputados e ambos ainda são alvo de investigação da Procuradoria-Geral da República (PGR) sob suspeita de apologia ao nazismo. Adrilles, por sua vez, foi demitido da emissora e denunciado ao Ministério Público Estadual, que também deve abrir uma investigação sobre o caso. Os três pediram desculpas e negaram qualquer ilegalidade. Porém, as pessoas devem ser sempre firmes contra o nazismo!

E quando me refiro ao nazismo, não quero dizer qualquer situação. Banalizar as coisas, pondo uma miríade de outros problemas dentro da mesma cesta intitulada “nazismo” não é correto. Isso só reforça o argumento dos próprios (neo)nazistas. Precisamos ter discernimento na vida.

De outra banda, na lista de males da humanidade há mais problemas graves (e aqui não estou comparando-os com o nazismo, me entendam bem), que levaram a mortandades enormes em nome de ideais totalmente equivocados, apropriados pela tirania de alguns Estados/Nações.

Por esse motivo, convém se vacinar sempre: contra a Covid-19, contra o nazismo e também contra o comunismo. Os extremos levam invariavelmente a grandes equívocos. E, para além do morticínio causado pela extrema direita nazista, principalmente contra os judeus, há outros tipos de genocídio, praticado contra seu próprio povo por tiranos da extrema esquerda. Há exemplos históricos e outros bem atuais, como pontuei noutra coluna, intitulada “O Dia Depois de Amanhã[5], tais como: o líder comunista Mao Tse-tung, responsável pela morte de cerca de 100 milhões de chineses, por fome e perseguição política; e outro tirano comunista, Josef Stalin, responsável pelo extermínio de cerca de 25 milhões de pessoas na União Soviética.

Então, sugiro que pesquise, saia do terraplanismo do ideário político e evite dar suporte a ideias más. Ideias que podem levar às piores tiranias já vividas na face do globo. O mundo abomina o nazismo e o condena, com duras vedações jurídicas. Obviamente, como o regime nazista não se compara com nada, a situação do comunismo é um pouco diferente, pois é tolerada. Acontece que trata-se de um regime que levou fome, opressão e morte por onde passou. Então, não caia nesse engodo do mal. Não há luta entre direita e esquerda, como querem te vender!! As pessoas estão separadas entre boas e más, apenas. A partir do momento em que você estuda os fatos compreende melhor o que quero dizer. Jamais apoie ideias ruins, mesmo involuntariamente.

O livre arbítrio é uma dádiva concedida à humanidade. Seu uso indiscriminado, como espeque para praticar o que bem lhe der na telha, não! Use o livre arbítrio a favor da humanidade. Para tanto, pesquise o significado do nazismo na história. Porém, aproveite para estudar também os regimes comunistas. E, ademais, compreenda de uma vez o que seja liberalismo[6]. Se todas as pessoas estiverem bem informadas a respeito, o mundo será um lugar melhor, invariavelmente!

Ricardo Dantas

Ricardo Dantas

Advogado