Em primeiro lugar, gostaria de advertir que não sou o portador da ética e da moral. Quer dizer, não escrevo para julgar o próximo, nem para pinçar criticamente essa ou aquela figura jornalística para denegri-la. A ideia desta coluna é simplesmente divagar sobre esse importante mecanismo democrático, que é a liberdade de expressão (algo que estou fazendo neste minuto, inclusive), e sobre os valores que regem essa liberdade.

O ser humano é um comunicador nato, tanto é verdade que sua sanha por transmitir ideias nos levou ao desenvolvimento da linguagem. Nos levou também à difusão do saber, que inicialmente era feita verbalmente, por meio de contos e lendas, passadas de geração em geração. A própria escrita remontaria à pré-história, quando os homens faziam desenhos nas paredes das cavernas como uma forma de se comunicar. Poder-se-ia argumentar que isso não é propriamente uma forma de ‘escrita’. Daí, nos ensina o site do Educa+ Brasil[1] que a escrita teria começado na antiga civilização mesopotâmica (atual Iraque), por meio dos povos Sumérios, que desenvolveram a escrita cuneiforme por volta de 4.000 a.C. Logo em seguida, os Egípcios, ao invés de se utilizar de argila e cunha, criaram a denominada escrita hieroglífica, formada por desenhos e símbolos, utilizando-se de um papel chamado papiro, feito a partir de uma planta de mesmo nome.

Pois bem, a utilização de papiros e, depois, do papel, proporcionou a reprodução em larga escala do saber humano. Ademais, com o advento da prensa de tipos móveis, inventada pelo alemão Johannes Gutenberg por volta de 1450, a difusão da informação ganhou outra escala. Tanto que este é considerado um dos acontecimentos mais influentes do segundo milênio d.C, segundo a Wikipédia[2], revolucionando a maneira como as pessoas concebem e descrevem o mundo, inaugurando a Idade Moderna.

Mais recentemente, no final da década de 1960, durante a Guerra Fria, foi criada a primeira rede de computadores pelo Departamento de Defesa dos EUA, dando início ao que hoje conhecemos pelo nome de internet, conforme ensina a Superinteressante[3]. Aí sim a difusão da informação (e do saber, porque não) ganhou velocidades surreais. Mais ainda nos anos 2000 graças ao boom de acesso à rede, o que viabilizou as redes sociais.

Feitas essas considerações sobre a difusão das informações, passemos ao comunicador.

No Brasil, em meados de Junho de 2009, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram, por 8 votos a 1, que o diploma de jornalismo não é obrigatório para exercer a profissão[4]. Segundo o Ministro Gilmar Mendes: “a formação em jornalismo é importante para o preparo técnico dos profissionais e deve continuar, nos moldes de cursos como o de culinária, moda ou costura, nos quais o diploma não é requisito básico para o exercício da profissão”, acrescentando que “as próprias empresas de comunicação devem determinar os critérios de contratação” e que “nada impede que elas peçam o diploma em curso superior de jornalismo”. Resumindo, por aqui, ter um diploma jornalístico é desejável, porém, não é obrigatório. E, com isso, não faço qualquer juízo de valor. Apenas descrevo os fatos como são, sob a ótica jurídica.

Em todo caso, mesmo que o sujeito não tenha formação acadêmica, ao exercer a profissão jornalística, mormente pelos veículos midiáticos de massa, nessa difusão de informações precisa observar a “ética jornalística”, que deve orientar sua conduta.

Quer dizer, ao fazer uma matéria jornalística, o profissional deve ter como missão, sempre, informar corretamente as pessoas. Para tanto, deve seguir os princípios[5]: da objetividade (sem se utilizar de adjetivos e advérbios opinativos), da imparcialidade (permitindo ao leitor distinguir textos jornalísticos do chamado ‘jornalismo opinativo’) e da verdade/precisão (pautar-se pela veracidade dos fatos, independentemente da linha política dos proprietários do veículo de comunicação onde trabalha). Tudo isso respeitando sempre o “sigilo da fonte”, conforme assegura nossa Constituição Federal.

Nesse sentido, analisando o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, que encontrei em duas versões diferentes, mas, bastante semelhantes – o da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ[6]) e o da Associação Brasileira de Imprensa (ABI[7]) – pude verificar que é dever do jornalista: combater a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais, econômicos, políticos, religiosos, de gênero, raciais, de orientação sexual, condição física ou mental, ou de qualquer outra natureza, além do que deve tratar com respeito todas as pessoas mencionadas nas informações que divulgar”. Como decorrência disso, o jornalista não pode “impedir a manifestação de opiniões divergentes ou o livre debate de ideias”. E mais, deve “ouvir sempre, antes da divulgação dos fatos, o maior número de pessoas e instituições envolvidas em uma cobertura jornalística, principalmente aquelas que são objeto de acusações não suficientemente demonstradas ou verificadas”. Tudo isso porque “a presunção de inocência é um dos fundamentos da atividade jornalística”.

Pois bem, eu acordo cedo e já no café da manhã assisto, na Rede Globo, ao ‘Bom Dia Brasil’. Na hora do almoço vejo o ‘Jornal Hoje’ e, à noite, sou audiência do ‘Jornal Nacional’. Há dias em que assisto inclusive ao ‘Jornal da Globo’, por volta de meia noite. Todos esses programas são telejornais e, portanto, não deveriam se calcar num conteúdo opinativo. Também vejo programas que são sim opinativos, como o ‘Globo News em Pauta’ e alguns outros. Sinceramente, não há diferença entre o que pensam os jornalistas (seu subjetivo) e o que divulgam como matéria jornalística (objetiva). Isso confunde, engana, o espectador – que toma a opinião de outrem como uma verdade, na medida em que acredita que o que se noticia é uma informação jornalística apurada. É um erro básico da profissão, como já apontado. Mais: é algo escancaradamente antiético. E isso se espraia também pela internet, em seus sites ‘G1’ e ‘O Globo’.

Não que isso ocorra apenas na Globo, claro!! Há mais exemplos em outras emissoras. Porém, nesses outros veículos de imprensa me parece que há mais liberdade aos seus jornalistas. Quer dizer, não se criou uma linha editorial rígida, a ser seguida como um mantra por seus profissionais, o dia todo, desde a manhã até a noite (e madrugada). Ali, claramente, o jornalismo se perdeu. Há apenas difusão de uma opinião, como nesta coluna – que se chama “coluna” justamente por isso! Poderia eu dar exemplos, mas, convido você, leitor, a visitar o Twitter dos muitos medalhões que trabalham na Rede Globo e também em outros veículos. Ali o pessoal perfila o ódio, em alguns casos sem meias palavras. E são as mesmas pessoas que vêm ao noticiário te trazer “informação”. Há alguma isenção ali? É claro que qualquer pessoa pode ter um microblog ou um blog, inclusive jornalistas. Mas, a julgar pelo que escrevem no Twitter, estão de tal modo arraigados numa ideia, num pensamento, que seguramente isso atrapalha no jornalismo.

O Código de Ética dos jornalistas também preconiza que, mesmo nos casos em que estes invocam a “cláusula de consciência” – direito seu, de modo a evitar executar tarefas que “agridam as suas convicções” –, não podem utilizar isso como escudo, quer dizer, essa cláusula “não pode ser usada como argumento, motivo ou desculpa para que o jornalista deixe de ouvir pessoas com opiniões divergentes das suas”. Está escrito lá!

Qual foi a última vez que você assistiu a um programa da Rede Globo em que alguém, mesmo um convidado, discorda da linha de raciocínio trazida em alguma matéria? Quantos debatem de verdade alguma coisa por ali, com posições antagônicas? Está evidente a pasteurização das informações… Uma grande variedade de uma unidade! E isso na maior rede de emissoras do Brasil (e a segunda maior rede aberta do mundo)[8].

Não estou dizendo que a Globo “está comprada” ou qualquer coisa do gênero. Não vou ficar batendo em cima de teorias da conspiração. Apenas convido o leitor a se atentar ao fato de que a ausência de debate, de circulação de ideias antagônicas, é muito ruim para o público. A informação de qualidade sofre com isso. E mesmo que tomemos o que ali se veicula como artigos de opinião, dos jornalistas ou editores, ainda assim recomenda o Código de Ética que “a opinião manifestada em meios de informação deve ser exercida com responsabilidade. E isso porque, conforme tal Código, “é dever do jornalista: respeitar o direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do cidadão”. Seja tal “cidadão” político ou não, famoso ou anônimo, rico ou pobre, religioso ou ateu etc.

Vou terminar a coluna com um bom exemplo de jornalismo, aliado a opiniões emitidas por convidados de peso (e que costumam ser divergentes, aliás): ‘Jornal da Cultura’. Há na Globo News um excelente programa de opinião: ‘Manhattan Connection’ (que inclusive recrutou o bom jornalista Guga Chacra recentemente). Mas, estão devendo muito no jornalismo. Talvez porque as redações ficaram muito politizadas. Pode ser!?

Referências:

[1] https://www.educamaisbrasil.com.br/enem/lingua-portuguesa/historia-da-escrita

[2] https://pt.wikipedia.org/wiki/Prensa_m%C3%B3vel

[3] https://super.abril.com.br/mundo-estranho/quem-inventou-a-internet/

[4] https://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/1365753/stf-decide-que-diploma-de-jornalismo-nao-e-obrigatorio-para-o-exercicio-da-profissao

[5] https://pt.wikipedia.org/wiki/%C3%89tica_jornal%C3%ADstica

[6] https://fenaj.org.br/wp-content/uploads/2014/06/04-codigo_de_etica_dos_jornalistas_brasileiros.pdf

[7] http://www.abi.org.br/institucional/legislacao/codigo-de-etica-dos-jornalistas-brasileiros/

[8] https://pleno.news/entretenimento/tv/conheca-os-donos-das-maiores-emissoras-de-tv-aberta-do-pais.html

FOTO: https://www.google.com/search?q=emissoras+de+tv+no+brasil&rlz=1C1GCEA_enBR815BR815&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved=2ahUKEwjF9JuHgqLpAhWEC9QKHUogCb4Q_AUoA3oECBUQBQ&biw=1366&bih=657#imgrc=i6-RKdUQcvi8bM

Ricardo Dantas

Ricardo Dantas

Advogado